"BIOGRAFIA"

"José Chilra"

 
 
 

José Narciso Chilra – nome literário “José Chilra”; usa o pseudónimo de “Tiago Neto” – nascido a 24 de Abril de mil novecentos e cinquenta e um – natural de Juromenha; concelho de Alandroal, distrito de Évora.

É aposentado da Função Pública. O seu gosto pela poesia, surgiu aos 16 anos de idade. Logo que começou a ouvir os poetas populares, homens do campo que não sabiam ler nem escrever, com uma invejável memória e sabedoria. Passaram-lhe esses valores e logo começou a escrever os seus poemas, de caris popular, de quintilhas, sextilhas, décimas, quadras a oitavas, embora com interregnos ao longo da vida mas, nunca divorciado da escrita. É fã da poesia de António Aleixo, Florbela Espanca entre outros”. Actualmente é membro de “Confrades da Poesia” – Amora / Portugal

 
 
Bibliografia:
“Por Cima da Rama”
 
Sites:
http://laivosdepoesia.blogspot.com ; http://chilra.blogspot.pt/
 
 
Auto-retrato
 
 
Mote
 
Não sei falar de mim
Se falo, sou suspeito
Eu vejo-me um pouco assim
Mas, posso não ver direito!
 
I
Tenho uma baixa estatura
E um enorme coração
Deus me deu esse condão
E essa boa ventura
Tenho amigos com fartura
Sou pobre, sei de onde vim.
Não me envergonho do meu latim
Ao pé dos grandes letrados.
Sou camponês de sete costados
Não sei falar de mim.
 
II
Não tenho lá muita saúde
E tenho medo de morrer
Sou uma vara a tremer
Em média e grande altitude.
Todavia tenho a virtude
De andar na rua direito.
Jà fui príncipe eleito
No trono de minha mãe.
Sou descendente do bem,
Se falo, sou suspeito.
 
III
Tenho no sangue a timidez
E a força do trabalho
Hoje sei que pouco valho
Já fiz o que ninguém fez.
Tenho defeitos, sou cortês.
Recuso-me a ser Caim
Não digam mal de mim
Por não ser santo nem padre.
Aos sessenta anos de idade
Eu vejo-me um pouco assim.
 
IV
Tenho asco à arrogância,
Ao egoísmo, à hipocrisia
Adoro música e poesia
Da minha mãe, tive esta herança.
Os meus valores de criança
Conservo-os com muito jeito
Tenho esposa e filha no peito
Às vezes digo a brincar
Vejo o mundo a melhorar
Mas, posso não ver direito!

 
 
José Chilra - Elvas
 
 
 
 
 
 
 
Choram as pedras da rua
 
 
 
Amigo quando partiste
Não sei como conseguiste
Partir sem dizer adeus.
Foi um dia dos mais tristes
Porventura já não vistes
O carpir dos olhos meus !
 
Nesse dia acinzentado
Chorou a lua a meu lado
E uma nuvem lá no céu.
Ouvi o murmúrio do vento
E as estrelas do firmamento,
A chorarem quanto eu !
 
Murcharam as flores do campo
Nesse dia de dor e pranto
O sol não brilhou mais.
Choraram as avezinhas
E as penas das andorinhas
Escureceram muito mais !
 
Partistes precocemente
Meu amigo, toda a gente
Lastimou a sorte tua.
Hoje a saudade vai alta
Por cá fazeres tanta falta
Choram as pedras da rua !
 
Sendo que a vida é uma ponte
Talvez um dia te encontre
No outro mundo e depois
Ainda que seja tarde
Vamos a rir da saudade
E abraçar-mos os dois !
 
 
José Chilra (Tiago Neto) - Elvas
 
SOU COMO UM RIO
 

Um dia, o destino tingiu a minha vida
Com tinta diluída no meu peito aberto
Como um rio liberto escorreu desmedida
De negro vestida tão longe e tão perto!

À perda dum grande amor sobrevivi 
Porquanto estou aqui pela metade
Resistindo com verdade sem álibi
Só sei que já morri preso à saudade.

Os anos passaram porém, está presente
Esse amor latente, amor de criança
Coração balança; olhar de quem sente
Esse amor dolente que a visão alcança

Não sou fingidor, se bem me conheço
Tenho o que mereço a vida é assim
Agora por fim, já sou quem pareço
Contudo, não esqueço esse amor de mim

O sol de Agosto congelou-me em lugar frio
Muito sombrio vislumbrei o horizonte 
Hoje, como ontem, neste meu lugar vazio
Sou como um rio que chora na vazante!
 
 
José Chilra (Tiago Neto) - Elvas
A minha rua
 
 
A minha rua era um espaço
O espaço que me deu vida
Ali dei os primeiros passos
Vendo em si uma Avenida
 
Era uma pequena ruela
Com o nome de Quarteis
Construída à luz da vela
Ainda no tempo dos reis
 
As suas casas singelas
Só com uma divisão
Como eu nasci numa delas
P`ra mim era uma mansão.
 
Com o mesmo alinhamento
Casas com a mesma estrutura
Era o principal alojamento
Dos mineiros naquela altura
 
A minha rua estreitinha
Sem passeio para peões
Nem sequer asfalto tinha
Era toda de areões
 
Tinha sebes de manjericos
E perfume de alecrim
Tinha os portais mais bonitos
Com rosas; era um jardim!
 
Toda à volta, eram quintais
Com cães, porcos e galinhas
E no alto dos beirais
Faziam ninho as andorinhas.
 
Tinha um fiscal de tricas
Dez beatas, uma vidente
E ainda, duas Marianitas
A cheirar a aguardente.
 
A minha rua tinha o condão
De ter ódios e muitas estimas
Porta sim e porta não
Todos eram primos e primas.
 
Cheirava a ocre e a cal
A limpeza e muito labor
Após dez anos e tal
Mudei de casa e de amor
 
Hoje a minha rua tem
Cinquenta anos de saudade
Quando lá for vou a pé
Para ver se acho a tenra idade!
 
 
José Chilra (Tiago Neto) - Elvas
 
 
 
 
 
 
Aerograma
 
Mote
 
Meu, mensageiro aerograma
Não te demores por favor
Vai a aliviar o drama
No peito do meu amor
 
I
Longe de ti pátria querida,
Meu pedaço de papel
Levas aos meus olhos de mel
A minha lágrima caída.
Diz ao amor da minha vida
Que a saudade, por si chama
E o meu coração clama
Paz e amor nesta terra
Diz-lhe que aqui não há guerra
Meu, mensageiro aerograma
 
II
Aqui na Guiné Bissau
Não lhe digas que morreu
Ontem um amigo meu
Foi metralhada a sua nau.
Diz-lhe que o clima é mau
E que uma mulher de cor
Lava-me a roupa, é um favor
Por dez pesos semanais.
Dá notícias aos meus pais
Não te demores por favor
 
III
Não deixes subentender
Que tive com paludismo
E que ando a fazer turismo
Com as melgas, prás entreter.
Diz-lhe que não pode ser
Dormir com elas na cama.
A comida tem má fama
A água não é tratada
Bebo cerveja enlatada
Para aliviar o drama
 
IV
Meu mensageiro confidente
Contigo, já são uns mil
Que envio desta guerra hostil
Quase diariamente.
O regresso ao continente
É um sonho multicor
Tenho á espera uma flor.
Com o coração em estilhaços
Para  os juntar com abraços
No peito do meu amor
 
 
 
José Chilra (Tiago Neto) - Elvas
 
 
 

"CONFRADES DA POESIA"

www.osconfradesdapoesia.com